Academia Brasil-Europa© de Ciência da Cultura e da Ciência Akademie Brasil-Europa© für Kultur- und Wissenschaftswissenschaft
»_português---------»_deutsch---------»_impressum---------»_contato---------»_Brasil-Europa.eu
Nomes da história intercultural em contextos euro-brasileiros
A. DESCRAGNOLLE TAUNAY (1843-1899)
II Forum BRASIL-EUROPA, Leichlingen (1983) Série preparatória da Semana de Música Alemanha-França (1983) primeiramente como parte de aula do curso de Etnomusicologia da Faculdade de Música e Educação Artística do Instituto Musical de São Paulo (1973) A.A.Bispo
[Excertos em tradução, sem notas]
Antonio Alexandre Bispo
(...)
O presente texto, já antigo, oferece excertos de materiais destinados à discussão por escolares e professores durante o II° Forum Brasil-Europa, Leichlingen, Alemanha. Os materiais basearam-se em aulas do curso de Etnomusicologia da Faculdade de Música e Educação Artística do Instituto Musical de São Paulo, em 1973, coligidos por A. A. Bispo. É aqui publicado apenas com o objetivo de documentar os trabalhos realizados no âmbito da Academia Brasil-Europa e institutos integrados. Não reflete o estado atual dos conhecimentos. Principais datas do desenvolvimento dos estudos culturais concernente ao Visconde de Taunay. 1975. Etnologia Indígena do Leste e do Sul do Brasil. Instituto de Etnologia da Universidade de Colonia 1983. Semana França-Alemanha de Música, Leichlingen. Cultura Francesa no Brasil do Século XIX 1983. Pesquisa da obra musical de Taunay por Sylvia Maltese Moisés 1987. I° Congresso Brasileiro de Musicologia. Conferência de Sylvia Maltese Moisés 1998. Música no Encontro de Culturas. Universidade de Colonia 2002. Europa e o universo sonoro dos índios. Colonia e Universidade de Colonia. A.B.E. Indicações bibliográficas (sumárias) Visconde de Taunay, Scenas de viagem. Rio de Janeiro: Tipografia Americana, 1868. Visconde de Taunay, "A Cidade de Mato Grosso, o rio Guaporé e a sua mais ilustre vítima", Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro 54, parte 2a., 1891. A. d'Escragnolle Taunay. A cidade de ouro e das ruínas. São Paulo 1923. A. d'Escragnolle Taunay, Scenas de viagem, 2a. ed. São Paulo 1923. A. d'Escragnolle Taunay, Dois artistas máximos: José Maurício e Carlos Gomes, 1930 A. d'Escragnolle Taunay, "Centenário do Padre José Maurício Nunes Garcia," Revista do Instituto Histório e Geográfico Brasileiro 107/61 (1931), 688-705 A. d'Escragnolle Taunay, Entre os nossos índios. São Paulo 1931 A. d'Escragnolle Taunay, Visões do Sertão. 2a. ed. São Paulo: Melhoramentos 1928 A. d'Escragnolle Taunay, "Carlos Gomes e o Visconde de Taunay", Revista do Centro de Ciências, Letras e Artes de Campinas 56 (1936), 19-22 A. d'Escragnolle Taunay, Memórias do Visconde de Taunay: São Paulo: Instituto Progresso Editorial 1948 (Coleção Espelhos 1) Bispo, A. A. "Reaktion auf eine verklärte Sicht der Indianer-Kultur: Naturalistische Sicht der Wirklichkeit". Die Musikkulturen der Indianer Brasiliens: Stand und Aufgaben der Forschung IV: Zur Geschichte der Forschung. Anuário Musices Aptatio 2000/1. Roma/Siegburg 2001, 286-293. Posição de relêvo na história do pensamento do século XIX no Brasil cabe a Alfredo dEscragnolle Taunay (1843-1899), homem de múltiplos interesses, militar, político, administrador, escritor de grande popularidade e lente de escola superior, nobilitado com o título de Visconde de Taunay. Nas considerações histórico-musicais relativas à época do II° Império cumpre dar-lhe especial atenção, uma vez que também foi músico e compositor de mérito, embora não tivesse desempenhado papel decisivo na história da criação musical brasileira. Seria um êrro, porém, ver nesta sua atividade prático-musical e de composição o principal interesse histórico-musical da vida e obra do Visconde de Taunay. É significativo que, como compositor, empregasse sobretudo pseudônimos, tais como Flávio Elísio e Sílvio Dinarte. As suas obras são antes indicadoras do papel relevante dado à música na formação cultural do homem no seu todo e da nação. O significado do Visconde de Taunay para a História da Música apenas pode ser devidamente avaliado se a própria Musicologia Histórica tiver uma orientação decididamente cultural. O Visconde de Taunay muito lutou pelo reconhecimento do Pe. José Maurício Nunes Garcia e de Antonio Carlos Gomes, contribuindo decisivamente para o salientar desses "vultos máximos" da música do Brasil. Inseria-se aqui numa determinada corrente de pensamento e de concepção historiográfica, aquela baseada na história a ser escrita pelas grandes personalidades. Concepções concernentes ao homem e à função da música na formação da personalidade não podem ser entendidas sem a consideração da tradição familiar do Visconde de Taunay. Esta remonta a Nicolau Antonio Taunay, pintor de renome, membro da missão artística contratada na Europa por D. João VI, em 1816, a fim de organizar a Escola de Belas Artes no Rio de Janeiro. A vinda desses artistas e eruditos coincide com a época do fim da era napoleônica e da restauração dos Bourbons, quando vários intelectuais vinculados com o regime bonapartista resolveram abandonar a França.
O presente texto, já antigo, oferece excertos de materiais destinados à discussão por escolares e professores durante o II° Forum Brasil-Europa, Leichlingen, Alemanha. Os materiais basearam-se em aulas do curso de Etnomusicologia da Faculdade de Música e Educação Artística do Instituto Musical de São Paulo, em 1973, coligidos por A. A. Bispo. É aqui publicado apenas com o objetivo de documentar os trabalhos realizados no âmbito da Academia Brasil-Europa e institutos integrados. Não reflete o estado atual dos conhecimentos. Principais datas do desenvolvimento dos estudos culturais concernente ao Visconde de Taunay.
1975. Etnologia Indígena do Leste e do Sul do Brasil. Instituto de Etnologia da Universidade de Colonia 1983. Semana França-Alemanha de Música, Leichlingen. Cultura Francesa no Brasil do Século XIX 1983. Pesquisa da obra musical de Taunay por Sylvia Maltese Moisés 1987. I° Congresso Brasileiro de Musicologia. Conferência de Sylvia Maltese Moisés
1998. Música no Encontro de Culturas. Universidade de Colonia
2002. Europa e o universo sonoro dos índios. Colonia e Universidade de Colonia. A.B.E. Indicações bibliográficas (sumárias)
Visconde de Taunay, Scenas de viagem. Rio de Janeiro: Tipografia Americana, 1868.
Visconde de Taunay, "A Cidade de Mato Grosso, o rio Guaporé e a sua mais ilustre vítima", Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro 54, parte 2a., 1891.
A. d'Escragnolle Taunay. A cidade de ouro e das ruínas. São Paulo 1923.
A. d'Escragnolle Taunay, Scenas de viagem, 2a. ed. São Paulo 1923.
A. d'Escragnolle Taunay, Dois artistas máximos: José Maurício e Carlos Gomes, 1930 A. d'Escragnolle Taunay, "Centenário do Padre José Maurício Nunes Garcia," Revista do Instituto Histório e Geográfico Brasileiro 107/61 (1931), 688-705
A. d'Escragnolle Taunay, Entre os nossos índios. São Paulo 1931
A. d'Escragnolle Taunay, Visões do Sertão. 2a. ed. São Paulo: Melhoramentos 1928
A. d'Escragnolle Taunay, "Carlos Gomes e o Visconde de Taunay", Revista do Centro de Ciências, Letras e Artes de Campinas 56 (1936), 19-22
A. d'Escragnolle Taunay, Memórias do Visconde de Taunay: São Paulo: Instituto Progresso Editorial 1948 (Coleção Espelhos 1)
Bispo, A. A. "Reaktion auf eine verklärte Sicht der Indianer-Kultur: Naturalistische Sicht der Wirklichkeit". Die Musikkulturen der Indianer Brasiliens: Stand und Aufgaben der Forschung IV: Zur Geschichte der Forschung. Anuário Musices Aptatio 2000/1. Roma/Siegburg 2001, 286-293.
Pintura e música. Musicalidade da pintura de paisagens A tradição brasileira da família Taunay era marcada pelo amor à pintura, - sobretudo impregnada do intuito de retratação da natureza , e pelas viagens de cunho naturalista e etnográfico a regiões distantes e pouco conhecidas. Assim, Amado Adriano Taunay, filho mais novo de Nicolau Antonio Taunay, acompanhara Freycinet em viagem de circunavegação à Oceania e fizera parte da expedição ao interior do Brasil do Barão de Langsdorff, patrocinada pelo Czar Alexandre I° da Rússia. Morreu afogado no Rio Guaporé, no Mato Grosso, em 1828. Após o retorno de Nicolau Antonio Taunay à França, fora seu filho Félix Emílio (+1881) que o substituíra como professor de pintura na Escola de Belas Artes, da qual chegou a ser diretor. Félix Emílio, de interesses humanísticos, um dos fundadores do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, sempre viu as artes como parte integrante da formação da personalidade do homem. A pintura de paisagens possuia, no debate europeu, claros vínculos com uma concepção das artes na qual a música desempenhava importante papel. O paisagismo surgia como musical por excelência, e essa concepção era discutida e fundamentada estéticamente a partir de reflexões relativas à questão de conteúdo e forma. Há, portanto, apesar de todas as diferenças, uma certa lógica, uma coerência interna na tradição da família Taunay que permite melhor compreender a obra e o pensamento do Visconde de Taunay, também naquilo que diz respeito aos indígenas brasileiros. A sua aproximação às culturas indígenas, em particular do Mato Grosso, relacionou-se com a sua participação na Guerra do Paraguai. Também nos seus estudos a respeito foi ele um "pintor" na sua extraordinária capacidade de descrição da natureza, de situações, de ocorrências e de costumes.
O debate histórico-político-cultural francês e o indígena no Brasil Embora considerado como figura expressiva do Romantismo brasileiro, o Visconde de Taunay não pode ser integrado na corrente do indianismo literário de um José de Alencar, a quem criticava sobretudo por ser este seguidor de Chateaubriand. Ele próprio reconhecia em José de Alencar talento e grande força de trabalho, pena dúctil e elegante, criticava-o, porém, afirmando que esse escritor não conheceria absolutamente a natureza brasileira que tanto pretendia reproduzir, nem dela estava imbuído. Não lhe sentia o poder e a verdade. Descrevia-a do fundo do seu gabinete, lembrando-se muito mais do que lera do que daquilo que vira com os próprios olhos. Parecendo muito nacional, José de Alencar obedeceria mais do que ninguém à influência dos romances franceses. Para Taunay, Alencar deixara nos seus índios a trilha aberta por Fenimore Cooper para seguir mais de perto a Chateaubriand e as "pieguices de que se constituiu porta-voz este escritor, tornando-as toleráveis a poder da pompa e do brilhantismo da frase". Tudo seria, porém, artificial e cansativo. Alencar transformara os índios em heróis de verdadeiras estórias lendárias, oriundas dos Natchez, Atala e Réné, ou seja, em índios que se expressavam com linguagem poética e figurada de exuberância e feição oriental. Ao contrário dessa tradição indianista baseada em Chateaubriand, o Visconde de Taunay procurava retratar os indígenas segundo aquilo que constatara na realidade. Como ele próprio salientou nas suas Memórias, conheceu-os de perto, com eles conviveu seis meses a fio e pôde observá-los detidamente. De certo teriam eles uma forma de expressão por vezes pitoresca, de forma alguma, porém, mantinham conversações plenas de tropos e elegantes imagens como nos romances de Alencar. Além do mais, os indígenas não teriam segundo Taunay nenhuma idéia de Deus, - apesar de afirmações em contrário -, "nenhum vislumbre de religião", a não ser superstições, sendo a sua vida marcada por inteira despreocupação pelo futuro. E os indígenas que conhecera seriam aqueles de procedência e de cunho mais elevados: Chanés de Mato Grosso, divididos em quatro grupos (Chooronós ou Guanás, Kinikinaus, Laianos e Terenas).(Memórias do Visconde de Taunay, São Paulo 1948, 229-230) História militar e história da observação etnográfica Ao partir para o Mato Grosso durante a Guerra do Paraguai, A. dEscragnolle Taunay tinha-se proposto, ao lado de cumprir seus deveres militares, registrar fatos relevantes para a história militar e tudo quanto de notável observasse quanto à natureza e à população das regiões que percorreria. Sobretudo os índios despertaram-lhe a atenção, dedicando-se ao estudo de seus costumes e organizando vocabulários. Embora tendo perdido manuscritos na ocupação paraguaia da vila de Nioac, em 1867, A. dEscragnolle Taunay conseguira recuperar materiais que lhe permitiu incluir um vocabulário da lingua Chané ou Guaná como anexo às Scenas de viagem, sua primeira obra impressa (Rio de Janeiro: Tipografia Americana, 1868). (...) Dos desenhos e esboços recuperados, muitos relativos aos índios Guaná, alguns deles foram aproveitados por João Severiano da Fonseca na sua obra Viagem ao Redor do Brasil, outros como ilustrações de várias obras do autor, algumas delas de interesse etnomusicológico. Foram também aproveitados por Elisée Réclus no volume dedicado ao Brasil da sua monumental obra La terre et les hommes. (...) A. dEscragnolle Taunay pretendia, pelo que parece, publicar um estudo alentado sobre os indígenas que conhecera no Sul do Mato Grosso. Dos fragmentos deixados (talvez de uma obra inacabada: A Cidade de Mato Grosso), Affonso de E. Taunay organizou a primeira parte do livro Entre os nossos índios, uma obra que seria publicada apenas em 1931 (São Paulo: Melhoramentos). De título Entre os índios do sul do Mato Grosso, com 7 capítulos, inclui o vocabulário Guaná ou Chané, reproduzido de Scenas de viagem. A segunda parte reproduz integralmente o estudo sobre os índios Caingangs ou Coroados de Guarapuava, publicado sob o título Entre os índios do Paraná, no tomo 51 da Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Brasil. A obra inicia com a descrição do convívio de A. dEscragnolle Taunay com os Terenas da aldeia de Piranhinha, em 1866, onde recebera cordial acolhida. O capitão da aldeia tinha recebido formação cristã na aldeia dos Kinikinaus do Bom Sucesso ou Mato Grande, liderada pelo Frei Marianno de Bagnaia, e dirigia a aldeia de Naxe-daxe ou de Santa Cruz, a seis léguas de Miranda, sob severa disciplina, mantendo uma escola para meninos. Em 1867, chegou a ir com alguns de sua comunidade ao Rio de Janeiro. O autor salienta que os índios de Miranda, apesar da influência da missão e do longo contacto com os brancos, teriam conservado muito de suas tradições. Assim, na época da sua estadia, a aldeia preparava-se para uma festa, e vários indios "padres", debaixo de alpendres, cantavam para que o mel colhido fermentasse rapidamente. (Entre os nossos índios, op.cit. 14-15) O autor distingue dois importantes grupos na população indígena do distrito de Miranda, onde havia mais de dez aldeamentos: o Guaycurú e o Chané. O primeiro grupo compreendia três tribos: a dos Guaycurús propriamente dita, que gradualmente ia desaparecendo pelo contacto com a população branca, a dos Cadiuéos que se conservava em estado quase que selvático em terras próximas aos rios Paraguai e Nabilek, e a a dos Beaquiéos, que viviam com os Cadiuéos. Os Chanés subdividiam-se em quatro ramificações, os Terenas, os Laianas, os Kinikináus e os Guanás ou Chooronós. Os costumes e práticas desses grupos não seriam muito diferentes entre si. Caracterização ou "pintura" de tipos humanos Característico do pensamento e do estilo de Taunay é a tentativa de caracterizar a psique e o caráter de tipos humanos representativos de determinados grupos. Assim, o Terena é caracterizado como ágil e ativo, portador de inteligência astuciosa e propensa para o mal, aceitando com dificuldade idéias dos brancos e conservando usos e tradições, graças provavelmente a um espírito mais firme de liberdade. O Laiana seria um tipo de transição, com melhores instintos e menos antipatia para com os brancos, usando da língua portuguesa com maior facilidade. O tipo Kinikinau caracterizar-se-ia pela apatia, placidez e pouca propensão ao trabalho; nessa tribo haveria maior mistura racial, inclusive com africanos. O Guaná quase teria desaparecido, fundido nas populações índia, branca ou negra. O Guaycurú seria vigoroso, com feições grosseiras. Da tribo dos Guaxis restariam apenas poucos indivíduos, confundidos com a população de outras nações; entre os índios da região viviam também Caiuás escravizados. (...)
Influência cultural da missão através da música Do ponto de vista histórico-musical, os registros de Taunay permitem que se perceba a importância do aldeamento-modêlo do Baixo Paraguai: dos Kinikináus do Mato Grande ou do Bom Sucesso, próximo de Albuquerque. Nesse aldeamento, Frei Marianno de Bagnaia mantinha uma banda de música composta por indígenas (Entre os nossos índios, op.cit. 20). Os índios do distrito de Miranda teriam, porém, para Taunay, poucos conhecimentos da doutrina cristã. Cada tribo possuía um certo número de "padres cantores", ao mesmo tempo médicos e feiticeiros. As considerações de Taunay a respeito desses "padres cantores", apesar do seu cunho negativo, oferecem importantes subsídios para o estudo dos aspectos cerimoniais da prática do canto, do emprêgo de imitações de cantos de passáros e até mesmo da interação entre o pajé e as aves: (...) Taunay considerou por várias vezes o canto do pajé em seus escritos. Além de suas observações, baseou-se também em dados de F. Rodrigues do Prado sobre a maraca e a imitação do canto de diversos pássaros nos ritos de cura. "Os padres, cantadores infatigaveis, capazes de passar noites inteiras a invocar o macauán, como tantas vezes vi, eram geralmente os medicos de sua gente. Notei que nunca empregavam um unico simplice e jamais nelles percebi a idéa de que podiam lançar mão de uma planta medicinal. Limitavam-se a apartar o enfermo do contacto dos seus, apalpavam-no pelo corpo todo e punham-se a soprar no lugar enfermo pondo-se depois a cantar a sua melopéa, enfadonha ao ultimo ponto." (Entre os nossos índios, op.cit. 64) Também os cantos fúnebres receberam particular atenção de Taunay. As lamentações dos Chanés seriam extremamente ruidosas. Perto do rancho do autor, nos Morros, habitava uma índia velha que noite e dia lastimava a morte do filho pelos paraguaios. Ora enumerava, num cantar monótono, as virtudes do filho, ora rogava à lua que lhe recebesse a alma, ora ao sol que aquecesse o lugar em que fora prostrado. As manifestações de dor dos índios do Sul do Mato Grosso seriam "em todos os casos, sempre o mesmo ulular e as mesmas e invariaveis cerimonias, sem a menor gradação em suas demonstrações affectivas." (loc.cit). Também com referência ao canto nas cerimônias fúnebres o autor se baseia em F. Rodrigues do Prado, comparando o canto e o choro das mulheres, - que invocavam as ações do defunto, suas viagens, divertimentos e trabalhos-, com os de muitos povos de vários pontos do mundo e às das populações "atrazadas de muitas nações relativamente civilisadas." Taunay menciona a importância do canto nos costumes ligados à puberdade e ao casamento: "a moça é enrolada numa esteira, ao redor da qual dançam os pais, parentes e convidados, cantando, bebendo aguardente e comendo os presentes, que constituem a parte mais importante do acto e a principal attracção da cerimonia matrimonial." (op.cit. 44) (...) Constatação da organização binária da sociedade Taunay menciona a organização dual da sociedade tribal e que se manifestava nos jogos dos Kinikináus e Terenas. A importância dessa seu registro, embora breve, reside no fato de documentar o relacionamento da organização dual possivelmente autóctone da sociedade tribal com as duas alas ou cordões das tradições populares brasileiras. Assim, como estas e como as bandas de música das povoações do interior do Brasil, também as "metades" representadas nos jogos indígenas eram já designadas segundo os partidos políticos do Império, sendo chamadas respectivamente de "luzia" e "saquarema". (op.cit.69) (...) Questão de um povo sem música: Guaicurú Quanto à cultura Guaicurú, o autor cita novamente dados da "História dos Indios Cavalleiros ou da Nação Guaycurú" de Francisco Rodrigues do Prado (1795) segundo a reedição da obra na Revista do Instituto Histórico e Geographico do Brasil (1839). Durante a sua estada em Mato Grosso, Taunay conheceu membros dessa tribo, que já possuía apenas pequena população. Os demais ramos dessa nação, Cadiuéos e Beaquiéos, seriam muito ariscos e conservavam-se em terrenos mal explorados. No relato de Taunay, o povo Guaicurú surge como uma das raras culturas do mundo sem música: a música seria desconhecida e o índio Guaicurú jamais cantaria. Isso não queria dizer, porém, que não fosse sensível e não amasse a música. Pelo contrário, ouvia com fascínio as melodias dos portuguêses e sobretudo as mulheres se comoviam. Grande seria o poder da musica naquele povo que tanto se orientava por estímulos do ouvido.
(...) Indígenas do Paraná: Os Kaingang A. dEscragnolle Taunay entrou novamente em contacto com indígenas quando Presidente da Província do Paraná (1885-1886). Ali recebeu, no Palácio do Govêrno, um tuxaua dos Kaingangs que se lamentava do tratamento recebido pelos brancos. Posteriormente, em abril de 1886, viajando pelos Campos Gerais, a Ponta Grossa, Castro e Guarapuava, teve a oportunidade de trocar idéias com um grupo desses indígenas, obtendo subsídios para o um dicionário Kaingang-Português que preparava. O estudo "Os índios caingangs (coroados de Guarapuava)", publicado na Revista do Instituto Historico Brasileiro, foi também inserido na publicação póstuma Entre os nossos índios. Quanto aos costumes dos "coroados" do Paraná, o autor cita informações da "Memória sobre os índios caingangs e camés (coroados)" do missionário capuchinho Frei Luiz de Cemitille, publicada como apêndice do Catálogo dos objectos do Museu paranaense remettidos á exposição anthropologica do Rio de Janeiro (1882). De interesse etnomusicológico é a constatação de que esses indígenas sempre cantavam uns versos monótonos antes de dormirem: "inv´que que penné ima ará ie." (op.cit. 89). Quando voltavam das caçadas, a sua chegada era anunciada de longe com toques de buzina; o autor relata que esse instrumento era feito algumas vezes de taquara e, quando possível, de chifres de gado vaccum. De particular relevância é também aqui a descrição das cerimônias fúnebres, onde a música desempenhava importante papel: "Oito dias depois do enterro do morto, a um signal de busina, reunem-se na cabana dos parentes do fallecido todas as familias da tribu, com os corpos pintados de preto. Entram em silencio e com gravidade, e sentam-se sem distincção á roda do fogo (que quasi se estende de uma extremidade da cabana á outra) em duas fileiras, uma em frente da outra. Sentam-se as mulheres por traz dos homens; nesta posição começa o cacique a cantar em louvor do morto uma cantiga monotona; as mulheres, e a do morto sentada a um lado, choram, e os homens offerecem aos convidados comidas e aquiqui. Repentinamente levantam-se todos cantando e dançando em torno do fogo, formando uma scena animada e pittoresca o movimento dos corpos acompanhado com as mudanças dos passos de certeza admiravel, tendo todos nas mãos uma rama de folhas verdes ou um bordão pintado a capricho." (op.cit. 95) Dados sobre a cultura sertaneja Ao lado das referências às culturas indígenas em diferentes estágios de contacto, cumpre mencionar o interesse dos dados e das observações de Taunay relativas à cultura sertaneja, à recepção da música européia da época no interior do Brasil e a práticas devocionais populares. A publicação Visões do Sertão (2a. ed. São Paulo: Melhoramentos 1923), que inclui inéditos de Taunay, abre com o ensaio "Cruzando o Sertão", com onze capítulos, publicado em parte na imprensa, em 1897 e 1898, e que relata o regresso do autor de Mato Grosso ao Rio de Janeiro (1867). A segunda parte, de 13 capítulos, é intitulada de "Viagem filosófica aos Campos Gerais e ao sertão de Guarapuava", contendo o relato de viagem do autor quando Presidente do Paraná. Neste relato, salienta o talento musical de João do Prado Mineiro, membro da sua caravana e que tocava rabeca "com muita expressão e segurança de arco, de maneira que, em não poucos acampamentos, na viagem principalmente de São Paulo para Uberaba", realizara "deliciosas tocatas, executando, com muita afinação e por modo bem impressivo, trechos de Lucia de Lammermmor, Norma, Traviata e outras óperas italianas." (Visões do Sertão, op.cit. 13). Essa música trazia ao autor nostalgia de seus anos de infância, quando executava ao piano as mesmas melodias. O comandante Manuel Pedro Drago era "doido por musica italiana" e muito apreciava a arte de João Mineiro. Taunay descreve a chegada de um italiano com um realejo na povoação de São Francisco de Sales, o que ensejo a danças e festas nas vendas e casas de família. De interesse é a menção sobre a música religiosa dos escravos provenientes da fazenda estatal de Camapoan. Viviam num local denominado Corredor: "Na habitação de uma especie de mandigueiro, que exercia funcções de improvisado padre e rezava ladainhas, celebrava umas especies de missa e ajudava a bem morrer quem precisasse dos seus multiplos serviços de caracter comicamente sacerdotal, via-se o Crucifixo e imagens não de todo más, de Santos e Santas, um mundo de bugigangas e symbolos do mais grosseiro fetichismo." (Visões do Sertão, op.cit. 31) Concepções de catequese O método de catequese preconizado por Taunay era bastante singular do ponto de vista cristão: consistia, no fundo, em despertar nos índios desejos de consumo. Não sendo possível fazer com que os índios já maduros aprendessem rudimentos da religião cristã, o meio mais fácil seria inocular-lhes o amor ao trabalho e a ambição de ganhar e possuir coisas adquiridas à custa do esforço. Só os adolescentes e aqueles que já nasciam nos aldeamentos seriam capazes de receber instrução religiosa. (Entre os nossos índios, op.cit. 100)
O texto aqui publicado é apenas um das várias centenas de artigos colocados à disposição pela Organização Brasil-Europa na Internet. O sentido desses textos apenas pode ser entendido sob o pano de fundo do escopo da entidade. Pedimos ao leitor, assim, que se oriente segundo a estrutura da organização, visitando a página principal, de onde obterá uma visão geral: http://www.brasil-europa.eu Dessa página, o leitor poderá alcançar os demais ítens vinculados. Para os trabalhos recentes e em andamento, recomenda-se que se oriente segundo o índice da revista da organização: http://www.revista.brasil-europa.eu Publicações para resenhas devem ser enviadas ao seguinte endereço: Akademie Brasil-Europa Dieringhauser Str. 66 51645 Gummersbach, Alemanha Salientamos que a Organização Brasil-Europa é exclusivamente de natureza científica, dedicada a estudos teóricos de processos interculturais e a estudos culturais nas relações internacionais. É a primeira do gênero, pioneira no seu escopo, independente, não-governamental, sem elos políticos ou religiosos, não vinculada a nenhuma fundação de partido político europeu ou brasileiro, supra-universitária e originada de iniciativa brasileira. Foi registrada em 1968, sendo continuamente atualizada. Não deve ser confundida com outras instituições, publicações, iniciativas de fundações ou outras páginas da Internet que passaram a utilizar-se de denominações similares. Prezado leitor: apoie-nos neste trabalho que é realizado sem interesse financeiro por brasileiros e amigos do Brasil! Torne-se um dos muitos milhares que nos últimos anos visitaram frequentemente as nossas páginas. Entre em contato conosco e participe de nossos trabalhos: contato
O texto aqui publicado é apenas um das várias centenas de artigos colocados à disposição pela Organização Brasil-Europa na Internet. O sentido desses textos apenas pode ser entendido sob o pano de fundo do escopo da entidade. Pedimos ao leitor, assim, que se oriente segundo a estrutura da organização, visitando a página principal, de onde obterá uma visão geral:
http://www.brasil-europa.eu
Dessa página, o leitor poderá alcançar os demais ítens vinculados. Para os trabalhos recentes e em andamento, recomenda-se que se oriente segundo o índice da revista da organização:
http://www.revista.brasil-europa.eu
Publicações para resenhas devem ser enviadas ao seguinte endereço:
Akademie Brasil-Europa Dieringhauser Str. 66 51645 Gummersbach, Alemanha
Salientamos que a Organização Brasil-Europa é exclusivamente de natureza científica, dedicada a estudos teóricos de processos interculturais e a estudos culturais nas relações internacionais. É a primeira do gênero, pioneira no seu escopo, independente, não-governamental, sem elos políticos ou religiosos, não vinculada a nenhuma fundação de partido político europeu ou brasileiro, supra-universitária e originada de iniciativa brasileira. Foi registrada em 1968, sendo continuamente atualizada. Não deve ser confundida com outras instituições, publicações, iniciativas de fundações ou outras páginas da Internet que passaram a utilizar-se de denominações similares. Prezado leitor: apoie-nos neste trabalho que é realizado sem interesse financeiro por brasileiros e amigos do Brasil! Torne-se um dos muitos milhares que nos últimos anos visitaram frequentemente as nossas páginas. Entre em contato conosco e participe de nossos trabalhos:
contato
Todos os direitos são reservados. Cópias de textos e ilustrações, ainda que parciais, apenas com permissão expressa da Academia Brasil-Europa. Citações e referências devem conter indicação da fonte.