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Nomes da história intercultural em contextos euro-brasileiros
Ferdinand Denis (1798-1890)
Ferdinand Denis tem sido insuficientemente considerado nos estudos interculturais no contexto euro-brasileiro. É um autor que merece particular consideração pelo número de obras que dedicou ao Brasil e, sobretudo, pela sua particular consideração da natureza dos trópicos. Assume, assim, especial relevância histórica nos estudos atuais que procuram desenvolver estudos culturais de orientação ambiental.
Nascido em 1798, veio ao Brasil em 1816, com dezoito anos, visitando o Rio de Janeiro e a Bahia. Retornou a Paris antes de maio de 1820. A sua estadia cai assim na época da Missão Artística francesa ao Brasil e no período imediatamente anterior à proclamação da independência.
Após o seu retorno, publicou, juntamente com M. H. Taunay, a obra fundamental relativa ao Brasil dos anos 20 do século XIX no mundo de língua francesa: Le Brésil ou Histoire, Moeurs, usages et coutumes des habitants de ce Royaume. A obra, ornamentada com numerosas gravuras de desenhos feitos por M. H. Taunay, foi publicada em 6 tomos em 1821 (I e II) e 1822 (do III ao VI) em Paris, pela editora Nepveu. A colaboração com Hippolyte Taunay, filho do pintor Nicolas Taunay, muito contribuiu à criação de uma imagem romântica do Brasil na Europa do século XIX.
Nos anos seguintes deu continuidade às suas produções dedicadas aos países sul-americanos e às suas culturas. Em 1823, publicou Buenos-Ayres et le Paraguay, ou Histoire, moeurs, usages et coutumes des habitantes de cette partie de l'Amérique, em dois volumes, com gravuras, na mesma editôra e mesma coleção. No mesmo ano, publicou La Guyane, ou Histoire, moeurs, usages et coutumes des habitants de cette partie de l'Amérique, igualmente pela mesma casa e na mesma coleção.
Interessou-se também pelos estudos portugueses, publicando, nesse ano de 1823, a obra Chefs d'Oeuvre du Théâtre Portugais (Paris: chez L'advocat).
Em 1824, publicou, em Paris, juntamente com M. H. Taunay, uma Notice historique et explicative du Panorama de Rio de Janeiro (Paris: Nepveu) e o seu livro importante livro Scènes de la Nature sous les Tropiques, et leur Influence sur la Poésie, suivie de Camoens et Jozé Indio (Paris: L. Janet), obra considerada por Charles-Augustin de Sainte-Beuve no Le Globe (18 de dezembro de 1824). Preocupava-se com a difusão maior dos conhecimentos, publicando obras mais resumidas de seus trabalhos, como Résumé de l'Histoire du Brésil, suivi de Résumé de l'Histoire de la Guyane (Paris: Lecointe et Durey, 1825), Résumé de l'Histoire littéraire du Portugal, suivi de Résumé de l'Histoire littéraire du Brésil (Paris: Lecointe et Durey, 1826) e Résumé de l'Histoire de Buenos-Ayres, du Paraguay et de Provinces de la Plata, suivi du résumé de l'Histoire du Chili (Paris: Lecointe et Durey, 1827).
Em 1827, publicou André le Voyageur, Histoire d'un Marin (Paris: L. Janet). Em 1829, lançou o romance histórico em cinco volumes Ismail ben Kaizar ou la Découverte du Nouveau Monde (Paris: Gosselin).
Para uma maior difusão de conhecimentos sobre o Brasil e sua cultura na Europa contribuiu o seu texto Voyages dans l'Intérieur du Brésil, publicado na popular Revue des Deux Mondes (abril-junho de 1831), com um compte-rendu dos dois primeiros volumes das Voyages (...) de Saint-Hilaire.
Em 1833, surgiu uma de seus importantes trabalhos dedicados à história dos Descobrimentos, a coletânea Les Navigteurs, ou Choix de Voyages anciens et modernes (Paris, L. Janet). No mesmo ano, publicou, na coleção Bibliothèque Populaire d'Ajasson de Grandsagne, Le Brahme Voyageur et la sagesse populaires de toutes les nations (Paris: Casimir). O ensaio que precedeu a essa obra, o Essai sur la philosophie de Sancho (Paris: Ledoux), foi premiado pela Académie Française. A obra conheceu várias edições. Também no mesmo ano de 1833 publicou a Histoire Géographique du Brésil na coleção Bibliotèque Populaire (Paris: Casimir) e, na Coleção L'Univers, Histoire et Description de tous les Peuples, a grande obra Brésil, juntamente com Colombie et Guyanes de C. Famin (Paris: Firmin Didot). Com essas obras, F. Denis tornou-se definitivamente o principal representante dos estudos brasileiros na França e na Europa em geral.
Em 1835, editou Luiz de Souza, em dois volumes (Paris: Gooselin). Em 1939, publicou os dois volumes das Chroniques chevaleresques de l'Espagne et du Portugal, suivies du Tisserand de Ségovie, drame du XVIIème siècle (Paris: Ledoyen). A tradução alemã de seus grandes trabalhos dedicados ao Brasil foi publicada nesse ano sob o título Geschichte und Beschreibung von Brasilien und Guyana von Ferdinand Denys (trad. de C. A. Mebold), com 100 gravuras e 2 mapas, em Stuttgart (G. Schwizerbart's Verlagshandlung, 1839).
Obras de particular interesse etnológico, para o Brasil, foram o estudo Des Ornements de la lèvre inférieure en usage chez quelques peuples de l'Amérique, publicado na revista ilustrada Magasin Pittoresque (Paris, 1850), e Arte Plumaria: Les plumes, leur valeur et leur emploi dans les arts au Mexique, au Pérou, au Brésil, dans les Indes et dans l'Océanie (Paris: Ledoux, 1873).
Foi conservador da Biblioteca de Sainte-Geneviève. Considerado como o maior representante dos estudos americanos, foi convidado para a assumir a Presidência de Honra do VIII Congresso dos Americanistas. No Brasil, foi muito admirado por Pedro II°, que o visitou na França.
Seus estudos históricos levaram-no a publicar, em 1864, a obra Voyage dans le Nord du Brésil fait dans les années 1613 et 1614 par le Père Yves d'Evreux, com introdução e comentários (Paris, A. Franck), marco nos estudos franco-brasileiros.
Principais datas do desenvolvimento dos estudos dedicados a F. Denis 1977. São Paulo na obra de F. Denis. Universidade de Colonia 1980. Apresentação européia da edição de Os Maxacalis pelo Conselho Estadual de Artes e Ciências Humanas de S. Paulo em sessão preparatória do Simpósio de São Paulo, de 1981, no IEHE, Colonia 1983. Colóquio: Estudos de F. Denis. Semana Franco-Alemã. Forum Brasil-Europa. Leichlingen 1989/90.100 anos de morte de F. Denis. I° Colóquio de estudos euro-brasileiros. Bonn e Colonia 1998. 200 anos de nascimento de F. Denis. Observações de interesse histórico-musical e etnomusicológico de F. Denis. Música no Encontro de Culturas. Universidade de Colonia 2002. Música indígena na obra de F. Denis. Colóquio Europa e o mundo sonoro dos índios. A.B.E. e Universidade de Colonia Indicações bibliográficas: Moreau, P., F. Denis, Journal (1798-1890) avec une Introduction et des Notes, Fribourg, Paris, 1932 Bourdon, L. Lettres familières et Fragment de Journal Intime de F. Denis à Bahia (1816-1819). Coimbra edit. (Separata de Brasília, X) Le Gentil, G. F. Denis iniciador dos estudos portugueses e brasileiros, in Biblios IV (Coimbra), 1928. Denis, Ferdinand. Os Maxacalis. Trad. M. C. de Moraes Pinto. Edição crítica, introdução, notas e apêndice de Jean-Paul Bruyas. São Paulo: Conselho Estadual de Artes e Ciências Humanas, 1979 (Coleção ensaio, 92) Bispo, A.A. Musik in der poetischen und sentimentalen Ethnologie der Tropen, in: Die Musikkulturen der Indianer Brasiliens: Stand und Aufgaben der Forschung IV: Zur Geschichte der Forschung. Jahrbuch Musices Aptatio 2000/2001, Roma/Siegburg 2001, 143-158 [Excertos de trabalhos]
Principais datas do desenvolvimento dos estudos dedicados a F. Denis
1977. São Paulo na obra de F. Denis. Universidade de Colonia 1980. Apresentação européia da edição de Os Maxacalis pelo Conselho Estadual de Artes e Ciências Humanas de S. Paulo em sessão preparatória do Simpósio de São Paulo, de 1981, no IEHE, Colonia
1983. Colóquio: Estudos de F. Denis. Semana Franco-Alemã. Forum Brasil-Europa. Leichlingen 1989/90.100 anos de morte de F. Denis. I° Colóquio de estudos euro-brasileiros. Bonn e Colonia 1998. 200 anos de nascimento de F. Denis. Observações de interesse histórico-musical e etnomusicológico de F. Denis. Música no Encontro de Culturas. Universidade de Colonia
2002. Música indígena na obra de F. Denis. Colóquio Europa e o mundo sonoro dos índios. A.B.E. e Universidade de Colonia Indicações bibliográficas:
Moreau, P., F. Denis, Journal (1798-1890) avec une Introduction et des Notes, Fribourg, Paris, 1932
Bourdon, L. Lettres familières et Fragment de Journal Intime de F. Denis à Bahia (1816-1819). Coimbra edit. (Separata de Brasília, X)
Le Gentil, G. F. Denis iniciador dos estudos portugueses e brasileiros, in Biblios IV (Coimbra), 1928.
Denis, Ferdinand. Os Maxacalis. Trad. M. C. de Moraes Pinto. Edição crítica, introdução, notas e apêndice de Jean-Paul Bruyas. São Paulo: Conselho Estadual de Artes e Ciências Humanas, 1979 (Coleção ensaio, 92)
Bispo, A.A. Musik in der poetischen und sentimentalen Ethnologie der Tropen, in: Die Musikkulturen der Indianer Brasiliens: Stand und Aufgaben der Forschung IV: Zur Geschichte der Forschung. Jahrbuch Musices Aptatio 2000/2001, Roma/Siegburg 2001, 143-158
Ferdinand Denis Etnologia sentimental dos trópicos: estudos culturais e poesia
(Texto simplificado para a discussão com jovens em colóquio dedicado aos estudos de Ferdinand Denis no âmbito da Semana França-Alemanha do Forum Brasil-Europa de Leichlingen, 1983. Tradução do alemão)
Antonio Alexandre Bispo
Um aspecto que não pode ser negligenciado no estudo do pensamento e dos conhecimentos relativos ao índio e sua música em autores de língua francesa do século XIX é o vínculo, ou melhor o interrelacionamento que se estabeleceu entre a História Natural e a Poesia.
Poesia, história natural e estudos culturais O fascínio poético pelo índio se manifestou em várias obras de autores franceses dos anos da Independência do Brasil. Edouard Corbière publicou, em 1823, as Elegias brasileiras, uma obra poética na qual a temática musical adquire importância. Assim, o autor fala de canto de amor, canto do himeneu, canto de guerra, canto de morte como provocação do inimigo feita pelo prisioneiro que vai morrer, canto de morte de uma virgem, etc. Ele faz imitação de canções brasileiras e apresenta um "canto de uma jovem esposa. Na carta-prefácio, as Elégies são apresentadas como sendo traduções das "heróides cantadas pelos índios desde tempos imemoriais. Entre outras obras, pode-se citar neste contexto também um romance de D. Gavet, um autor que viveu no Brasil e no Uruguai, de 1818 a 1825, publicado em 1830. História Natural e Poesia uniram-se, porém, sobretudo na obra de Ferdinand Denis, considerado por muitos como sendo o pioneiro dos estudos americanistas. Denis esteve no Brasil de 1816 a 1820, visitando o Rio de Janeiro e a Bahia. Em 1824, saiu à luz o seu livro Cenas da natureza sob os trópicos e sua influência na poesia, uma obra que procurava revelar a beleza dos trópicos, salientando o significado da natureza tropical para a arte poética. Essa obra poderia ser considerada como uma tentativa de criação de uma Poética tropical no sentido amplo do termo. Seria como que uma precursora das "ciências tropicais da cultura, nas quais a percepção e interpretação sensíveis da realidade tropical exigiriam do estudioso uma atitude ao mesmo tempo científica e criadora, além da capacidade de superação de fronteiras. Se esse livro tivesse tido tanta repercussão como as obras de Chateaubriand, então possivelmente não teria sido apenas a romântica redescoberta do Cristianismo que teria tanto influenciado a cultura e as artes do século XIX, mas sim, a Natureza tão decantada por F. Denis. Assim, esse trabalho inclui, ao lado das observações do viajante tomadas no Brasil, cenas exóticas apreendidas da literatura a respeito da India, do Taiti, das Ilhas Canárias, da África, do mundo árabe e da América espanhola. Essa publicação testemunha o exotismo sentimental da época, representando assim um documento significativo da história do pensamento etnográfico, um testemunho de uma fase da disciplina próxima daquela que se poderia chamar de etnografia pitoresca, porém muito mais séria e fundamentada. A sua obra reflete a convicção de que os trópicos exerceriam uma ação determinante na cultura: os países submetidos à influência do sol ardente dos trópicos apresentariam, em seus aspectos e produções, um caráter muito diferente daquele da Europa. Com essa convicção, exerceu uma influência considerável na poesia brasileira, contribuindo para a exaltação dos povos autóctones.
(...)
Observações relativas a culturas indígenas do Leste do Brasil Do ponto de vista do estudo do pensamento concernente à música indígena, cumpre considerar sobretudo a sua"verdadeira novela da tribo Maxacali (veja indicações bibliográficas à edição ao lado) O autor entrou em contacto com grupos indígenas da região de Belmonte e Jequitinhonha. Quis ver algumas das aldeias formadas na costa, pretendia avançar terra adentro e nada negligenciar para conhecer a maneira como viviam as nações indígenas que haviam escapado, pela sua coragem, a três séculos de destruição e às doenças que se propagavam entre elas com rapidez assustadora. O viajante questionava o que tinham obtido esses índios infelizes ao abandonarem as tribos de seus pais e que conhecimentos os europeus lhes tinham dado em troca da feliz despreocupação em que anteriormente viviam: reunidos em aldeias miseráveis, desprezados pelos brancos e pelos africanos, atormentados por novas necessidades que não poderiam satisfazer, não se integravam à população do Brasil; desapareciam pouco a pouco, sem que se pudesse assinalar uma verdadeira causa do aniquilamento de todo um povo.
A narrativa abre-se com a descrição de um funeral do capitão-mor da província, morto por um jaguar, que o autor presenciara na chegada a Canavieiras, povoação recém-fundada para a proteção do comércio de Minas Novas. A sua primeira impressão é de cunho musical: cantos fúnebres de colonos, africanos, indígenas, reunidos pela dor por causa do falecimento de uma personalidade que protegia tanto o índio como o civilizado, acompanhavam um caixão que seria depositado na igreja da aldeia. A maior parte vertia lágrimas, mas o autor constatou que os indígenas, "sempre extremados naquilo que os afeta, lançavam os gritos mais sentidos. (F. Denis, Os Maxacalís, op.cit. 5) Para Denis, o sentimento de dor seria o mesmo no coração de todos os homens, existiria, porém, muita diferença na maneira de exprimi-lo. Denis salienta que nunca vira funeral semelhante pelos lamentos daquelas pessoas, tão diferentes pela cor, pelos costumes e pelo temperamento. Foi, a seu ver, uma oração fúnebre comovente. Os Botocudos (Aimorés) e os Maxacalis estavam presentes nesse cortejo; as duas tribos achavam-se reunidas provavelmente pela primeira vez e a dor silenciara a inimizade que reinava entre elas. Os Botocudos estariam ainda em "completa barbárie e mantinham ainda os usos tradicionais. Durante o cortejo, as mulheres, sobretudo, manifestavam sua dor do modo mais ruidoso; os homens levavam na mão um maracá, "fazendo-as ouvir os sons desse instrumento selvagem e induzindo-as a cantarem ainda mais alto as virtudes daquele que lamentavam. (op.cit. 6) Após as palavras do sacerdote cristão, as cerimônias indígenas tiveram prosseguimento. Como o chefe dos Botocudos não sabia exprimir-se em português, entoou "um canto sentido, no qual lembrou as virtudes do capitão-mor e disse, chorando: Era um grande caçador, um amigo sincero dos índios. Os Maxacalis responderam-lhe, por três vezes: Ele está morto e nós estamos de luto; agora só o veremos atrás das montanhas negras onde ele se regozija com nossos pais.(op.cit. 6) No túmulo, foram depositadas flores, frutos e caça como dons expiatórios oferecidos ao espírito maligno. "Esse encontro de duas tribos, reunidas para chorar um homem que sempre as protegera, obteve um efeito dos mais felizes: as palavras de amizade foram ditas de parte a parte e entoaram-se cantos de paz. (op.cit. 7) Acompanhando os Maxacalis no seu retorno à região de Belmonte, o autor diz ter assistido a uma festa com muita bebida após a construção da aldeia."A todo instante, as mulheres traziam enormes cabaças, cheias de vinho de mandioca; nós a víamos brigar entre si, para decidir quem as ofereceria aos guerreiros; e ouvíamos suas vozes esganiçadas confundirem-se com os sons roucos do maracá. As danças organizavam-se de todos os lados, os cantos animavam-se e o chefe pedia, em vão, um pouco de calma na alegria. (op.cit. 9) Segundo as informações do líder indígena, já cristianizado, a tribo tinha sido poderosa quando habitara em Mato Grosso; naquele tempo, a religião era simples e todas as manhãs entoavam à divindade um hino de agradecimento que era cantado primeiramente pelos anciãos e repetido por todos em seguida; os gênios benfazejos lhes davam coragem e eram temidos pelos outros índios. Na região do Belmonte, os guerreiros ainda entoavam o hino da manhã, conservando o costume de seus antepassados e "dir-se-ia estarem celebrando o sol que se livrava lentamente das nuvens (op.cit. 16). O autor refere-se pormenorizadamente ao problema do contacto cultural: o objetivo do antigo chefe na sua vinda à vizinhança dos portugueses no litoral teria sido procurar auxílio na fase de abandono da vida nômade. Quanto aos costumes, gostaria de seguir o exemplo dos Guaicurús que adotaram os costumes estrangeiros sem que abandonassem os de seus pais. Entretanto, os caçadores não quiseram trabalhar, deixando às mulheres a tarefa de cultivar a terra, e a vizinhança dos portugueses não tardou a ser funesta; além do mais, os Aimorés e os Capoxós os perseguiam. O líder, arrependido, diz ter escutado, durante a noite, o canto plangente do acauã, o mensageiro dos espíritos que falava de seus pais e pressagiava males. Apesar de todo o interesse desse relato, os seus dados, entretanto, segundo J.-P. Bruyas, não possuem valor científico próprio, nem mesmo a nível da coleta de fatos. Entretanto, refletem um considerável conhecimento de costumes indígenas que o seu autor adquiriu por diversos caminhos.
Obra magna dos estudos brasileiros do século XX
A tradução alemã da grande obra de Ferdinand Denis dedicada ao Brasil foi publicada sob o título Brasilien und Guyana, em Stutttgart, em 1839, incluída na série "Galeria de Quadros do Mundo ou História e Descrição de todos os países e povos, seus costumes, religiões e usos". Nessa obra, ilustrada com numerosas gravuras e mapas, de diversas origens, o autor oferece um quadro global da história do Brasil com base em pormenorizado estudo dos relatos dos cronistas, além de uma descrição da situação do país segundo suas observações pessoais. Também os dados referentes à música e à dança nas fontes históricas são alvo de particular consideração, com eruditos e sensíveis comentários. A fantasia poética do autor levou-o a pintar cenas de alta expressividade, ainda que às vezes inexatas do ponto de vista documental. O seu objetivo era apresentar o Brasil de forma histórica e pitoresca, tentando não cansar o leitor com grande quantidade de dados.
Observações de expressões populares: modinhas, lundu, batuca Deve-se salientar o singular interesse de F. Denis pelas manifestações da cultura popular e pela etnografia. Graça e originalidade descobria Denis muito mais nas expressões culturais do povo do que no teatro ou outras manifestações de arte erudita. Entre os paulistas, sobretudo, haveria uma predileção especial pelos cantos "nacionais. Qualquer pessoa que gostasse de melodias simples e expressivas se comoveria com as modinhas de São Paulo, uma cidade que, como já tinha observado um viajante francês, lembraria uma cidade da Andaluzia e, tal como em Cadiz, sempre se ouvia uma guitarra a soar de alguma janela. O povo tinha ali as suas danças especiais, entre elas sobretudo o Landou (Lundu), que lembrava muito a Chica das colonias francesas.
A graça do Landou estaria sobretudo baseada no movimento especial das partes inferiores do corpo, um movimento que o europeu não estaria em condições de imitar. Todas essas danças poderiam ser observadas diariamente no Rio de Janeiro, assim como também nas colonias francesas e em todo outro lugar onde vivessem africanos, ainda que sob nomes diferentes. Citando o viajante Golberry, diz que a partir de uma certa hora toda a África dança e que o africano "dança até mesmo entre sepulturas. Assim, no continente americano, sob a escravatura, os africanos não teriam deixado de praticá-la. No Rio de Janeiro, o visitante estaria sempre ouvindo o som de seus instrumentos nacionais, o Banza, o tambor do Congo ou o monocórdio de Loango. Em todo o lugar dançavam o Batuca, no qual expressava o impecilho e o prazer do amor; a Capoeira, similar a uma luta, e o Landou (Lundu), o qual já passara a ser apresentado no teatro.O Landou era não apenas dançado pelos africanos na forma descontraída que os caracterizariam em todas as partes do mundo como também pelas pessoas de cor em geral, apesar dessas, segundo Denis, pertencerem mais à raça indígena do que à negra. O mesmo acontecia com a dança do Batuca (Batuque).
Descrição altamente expressiva oferece Denis do carnaval (Entrudo), das festas religiosas e dos atos paralitúrgicos do Rio de Janeiro, por exemplo o dos costumes da coroação do imperador do Divino Espírito Santo. O entrudo, as cerimônias da Sexta-Feira Santa, as procissões de S. Francisco e outras encontrar-se-iam também em Salvador, em Pernambuco, em São Luiz e em outros lugares, ainda que sem a pompa do Rio de Janeiro. Nessas cidades se praticavam também divertimentos "muito pitorescos, tais como as brilhantes cavalhadas, os combates entre cristãos e mouros representados no dia da morte de Sebastião. Também aqui era sobretudo a gente de cor que mantinha as tradições. (op.cit. 127-129)
Visões da história e da pré-história do Brasil Denis contribuiu para a exaltação romântica, ainda que inexata, da celebração da primeira missa celebrada no Brasil, do primeiro congraçamento musical entre indígenas e europeus e da solenidade do levantamento da Cruz no ato do Descobrimento do país.
(...) Após retratar a cena do Descobrimento do Brasil, Denis inicia a parte científica de sua obra com considerações a respeito da Pré-História, comentando as diferentes hipóteses relativas à origem dos índios. Também aqui a música desempenha importante papel nas suas reflexões. Para ele, duas tribos principais teriam dominado o litoral do Brasil: uma delas teria sido de origem mongólica, a outra caucásica, os Tapuias (=Inimigo) e aqueles que falavam a língua Tupi, os vencidos e os vencedores.
Observações a respeito da religião dos indígenas: Maraca Para Denis, as idéias religiosas dos Tapuias teriam um substrato triste. Como os antigos cronistas teriam relatado, eles queixavam-se frequentemente dos espíritos que os atormentavam. O mais alto na hierarquia dos demônios seria Hucha, que queria ser venerado de forma misteriosa; todos os esforços para apaziguá-lo seriam, porém, em vão. O modo de sua veneração seria bastante simples, pois residia no uso de um instrumento musical: Uma cabaça ôca, contendo alguns seixos, encontrava-se sob um manto de algodão, numa espécie de tabernáculo. Quem quisesse solicitar algo ao espírito, assoprava algumas baforadas de fumo na abertura. Esse singular tabernáculo, para Denis símbolo da proximidade divina, desempenhava um papel central em todas as nações indígenas. Nos dois grandes grupos que constituiriam os indígenas do Brasil era denominada de Maraca. Quando as grandes nações extinguiram-se, o seu uso já havia se alastrado pelo litoral norte. Mesmo os indígenas considerados cristãos ainda a venerariam secretamente. Uma tribo poderosa dos Tapuias apresentava até mesmo o cognome de Maraca. Denis supunha ser esta a nação sagrada que, segundo um manuscrito existente na Biblioteca de Paris, presumivelmente de Francisco da Cunha, vivera na região de Salvador, uma cidade que teria sido a capital das nações indígenas. O termo Maraca podia, assim, para Denis, designar tanto o instrumento de guia das danças guerreiras como a própria divindade. O nome encontrar-se-ia, com variações, em grande número de denominações indígenas. O uso da Maraca entre os Tupís, que o teriam assimilado dos Tapuias, seria menos misterioso. O instrumento era uma cabaça oval ornamentada com penas vermelhas e azuis de arara. Um cabo atravessava a cabaça e, quando esta era agitada, soavam as sementes no seu interior. Denis levanta a hipótese de que esse ruído simbolizava o rugir do trovão, tão venerado por esses povos. De resto, como Denis anota, o instrumento podia ser observado ainda em vários povos indígenas do Brasil e também na América do Norte, onde era conhecido sob o nome de Chichiku. Nessas suas considerações a respeito da Maraca, Denis apoia-se sobretudo em Roulox Baro, que falou do "diabo na cabaça", assim como em Hans Staden, Pison, Léry, Claude d'Abbeville, Ives von Evreux e, entre os contemporâneos, em Koster, Príncipe de Wied-Neuwied e Spix e Martius. Baseando-se em Staden, menciona também a existência de uma espécie de "tabernáculo" no centro das aldeias dos Tupinambás, onde eram guardadas as maracas sagradas. A forma dessa cabana não deveria ter sido diferente das demais por ele pormenorizadamente descritas, e numa das quais esteve preso. Denis supõe que, em meados do século XVI, a veneração de Tupã e de deuses menores teria levado ao surgimento de verdadeiros templos entre os Tupinambás. O serviço religioso teria estado nas mãos de uma classe especial, os pagés e caraíbas, sacerdotes, médicos, visionários e profetas e que, segundo Humboldt, constituiam uma nação privilegiada, uma espécie de caldeus. Seriam eles que, após aconselharem-se com a Maraca, profetizavam se um ataque guerreiro iria ter sucesso ou não. Denis considera como um grande êrro supor que os indígenas fossem ateus. Quanto mais se analisasse a mitologia desses povos tanto mais se perceberia a metafísica que a caracterizava. Seria um êrro dizer que o termo Tupã significasse Trovão. Tupã seria o "Ser terrível", Tupacanunga o trovão que fazia quando queria ser ouvido, Tupã beraba o raio que sinalizava o esplendor divino. O oponente de Deus seria Anhangá, segundo alguns também Jurupary (ou Geropary), embora houvesse aqui problemas de interpretação. Segundo o Padre Ives d'Evreux, os pajés não falavam com Tupã mas sim com os legionários de Jurupary, o serviçal de Deus. Haveria também a idéia de um legislador divino que apareceria para iluminar os homens. Seria o Sumé, um enviado que teria ensinado os indígenas a plantarem mandioca e que fora identificado pelos cristãos com o apóstolo Tomé. (F. Denys, Brasilien und Guyana, op.cit.. 20)
Observações relativas ao simbolismo das danças indígenas
As festas indígenas continuavam a ser praticadas desde os tempos mais antigos realizando-se antes ou depois de combates. Denis considerava a existência de "danças simbólicas", ou seja, aquelas das quais as mulheres estavam excluídas. De acordo com as obras que consultou, repete dados de antigos autores relacionados com a música, a dança e os instrumentos musicais. A dança era denominada, em geral, com o termo Guau. Uma de suas formas mais comuns chamava-se Urucapy. Para os jovens, haveria a Curupirara. Outras danças seriam o Guaibipaye e o Guaibiabuçu. A dança mais solene e singular era aquela na qual os guerreiros, dispostos em enorme círculo, sem mudarem de lugar, contavam os seus feitos alternadamente, em tom sério e moderado. Essa dança seria antes uma cerimônia guerreira e teria lugar apenas de três em três anos. Uma dessas danças fora descrita pormenorizadamente por Lery. Para Denis, alguns dos povos indígenas tinham tido o privilégio de enviar poetas e cantores a outros povos. Esses bardos teriam tarefas distintas daquelas dos pajés ou visionários. Adquiriam, por vezes, similar dignidade e eram também responsáveis pela perpetuidade das sagas poéticas das grandes festas. Denis traça um quadro expressivo das "orgias sagradas" com consumo de bebida fermentada, das quais muitas vezes nasciam os atos guerreiros, uma vez que nelas se cultivava o ódio contra tribos inimigas. A música desempenhava importante papel nas incursões bélicas.
Observações relativas aos índios do Nordeste e do Norte
No tratamento dos índios do Ceará, Denis baseia-se sobretudo em Koster, que os visitou em 1809. Pertenciam provavelmente à nação dos Pitigoas. Assim como em todas as regiões sem florestas, os índios tinham perdido mais rapidamente as suas características culturais. Embora convertidos exteriormente ao Cristianismo, utilizavam-se ainda da Maraca, considerada também aqui como um símbolo religioso. Passavam dias e noites em danças e em cantos monótonos. Esses cantos não tratavam provavelmente de outra coisa do que de algumas de suas sagas, agora incompreensíveis. Não teriam mais cantos de guerra, que os incentivavam à luta. Tudo estaria extinto, até mesmo a memória da antiga independência. Ao tratar dos indígenas do Maranhão, Denis cita Claude d'Abbeville e Yves d'Evreux, lembrando a solene entrada de Tupinambás em Paris, em 1612, quando os índios, trazendo nas mãos Maracas, formaram uma procissão precedida por grande cruz. Supõe ter sido ingenuidade dos missionários não reconhecerem que os indígenas demonstravam o seu credo tradicional com aquele instrumento. Com relação aos Gamelas, Timbiras, Canelas finas, Denis não oferece dados de interesse musical. Critica a tentativa de distinção de nações em grupos cujas denominações terminavam em krans e gez: Sakamakrans, Capiekrans, Paramakrans, Xomekrans, Macamekrans, Procobgez, Cunaygez e Cryges. Todos seriam Timbiras. Os nomes das tribos não deveriam jamais ser confundidos com o nome do povo do qual se originaram.
Observações relativas aos índios da Amazônia A imaginação poética de Denis manifesta-se mais uma vez no papel que concede à música entre os índios da Ilha Marajó. Após ter considerado a ação missionária do maior orador sacro de Portugal, o Pe. Antonio Vieira, trata dos índios N'hengahibas que, como os Paiaguas, eram índios navegantes, denominando-se a si próprios Igaruanas, ou seja, canoeiros. Essa denominação, posteriormente também teria sido dada a outros grupos indígenas da ilha, Tupinambas, Mammayamas, Guayanas, Huruunas , Pacayas e outros. Os Igaruanas não possuiam apenas pequenas canoas, mas também grandes embarcações construídas de um só tronco, denominadas Maracatim. Essa denominação seria derivada do instrumento musical sagrado dos Tupinambás, Maraca, e a terminação significaria o bico de um pássaro. A Maraca era fixada ao topo de uma longa vara à frente da embarcação de guerra e um índio fazia-a soar continuamente puxando uma corda a ela amarrada. Os Mundurucús eram, para Denis, o povo que, apesar de todos os contactos com os europeus teria conservado mais fortemente os seus costumes, entre eles as festas baseadas nas sagas e, sobretudo, as danças religiosas que executavam, não por divertimento, mas sim por serem parte do serviço religioso. (op.cit. 306) O entusiasmo de Denis pelas grandes danças e festas religiosas dos povos indígenas manifesta-se sobretudo na sua descrição dos costumes dos povos do Orinoco e do Amazonas. Com base nos relatos de viajantes, salienta a magnífica variedade dessas festas e danças religiosas. Cita a procissão dos Botuko, na qual soaria o trompete sagrado e os sons fúnebres que afastavam tudo aquilo que não era santificado, propagando a fertilidade através das selvas. Menciona as grandes danças circulares que os Apiacás teriam herdado dos Tupís e que certamente realizariam ao som de cantos sagrados. Entre as cerimônias mais estranhas, comparáveis apenas às expressões "mais bizarras e burlescas da civilização européia", encontrar-se-iam as procissões de máscaras dos Ticunas ou Tacunas no país dos Solimões. Esta não seria, em verdade, a única região do Amazonas na qual se observaria a prática de tais mascaradas. O uso de máscaras não seria apenas constatável pela arqueologia na antiguidade mexicana ou nas ilhas do Caribe, como Cristóvão Colombo encontrara, mas sim também na região do Rio Negro, fato já salientado por autores tais como Oviedo e Navarrette. (op.cit. 307-308)
Denis afasta-se da opinião segundo a qual as máscaras dos Ticunas nada mais seriam do que uma imitação da natureza. O gênio criador do artista das selvas não poderia ter-se apenas limitado a imitar aquilo que via. Também ele teria certamente captado o aspecto grotesco da realidade e tentado retratá-lo à sua maneira. Não seria a primeira vez que o espírito do indígena retrataria criticamente o aspecto e o andar dos animais. Vários exemplos de outras regiões da terra poderiam confirmar esse fato, tais como as danças dos cangurus ou a de caça ao tigre. Para ter-se uma idéia das mascaradas dos Tucunas, Denis sugere que se imagine um grande cortejo de índios aparecendo ao topo de uma colina ao cair da tarde, à frente vindo uma mulher, marcando o compasso da marcha com batidas num casco de tartaruga: Uns vão nús, trazendo na cabeça máscaras estranhas; outros pintaram todo o corpo com cores brilhantes à moda indígena; outros, ainda, estão vestidos com longas mantas e representam horríveis gigantes. - Denis salienta que seria difícil procurar a origem desses cortejos festivos sem que se penetrasse no âmago das idéias religiosas indígenas. Costumes igualmente estranhos encontrar-se-iam em outros povos do Amazonas, tais como entre os Jummas, os Parintintins e os Araras. Todos eles seriam porém restos de grandes populações desintegradas, tais como a dos Omaguas, catequizados pelos antigos jesuítas e que viviam em restos de reduções, sem brilho e originalidade.
Observações relativas aos indígenas do Leste do Brasil
(...) Nada seria mais comum na História do Brasil do que o fato de um povo, outrora poderoso, ser obrigado a abandonar o seu território e mudar-se para longínquas florestas. Somente alguns costumes manteriam o elo com o seu grande passado e, entre eles, o uso da Maraca. Um desses povos era o dos Camacans-Mongoyos no Brasil-Leste, que denominavam a Maraca de Kekiekh. Uma denominação semelhante do instrumento encontrar-se-ia em outra região das Américas, uma vez que os nativos da Flórida a chamavam de Chichikueh. Pintando a cena de uma de suas festas, Denis menciona alguns de seus instrumentos: "De repente soa a Maraca e levanta-se uma grande gritaria: o instrumento que marca o compasso chama-se Herenehedioca e é talvez o instrumento mais estranho das nações americanas. É constituido por dois maços de cascos de tapir presos a um cordel, pelo qual são agitados. A dança dos Mongoyos não é menos bizarra do que a sua música. A única coisa que tem em comum com a dos Tupís é a sua monotonia. Ela é também de uso entre os Coroados em Minas, que apresentam de resto muitas similaridades com os Mongoyos. Quatro indivíduos, com os corpos pendidos para a frente descrevem um círculo andando com passos comedidos um atrás do outro. Todos repetem com poucas modulações as sílabas: hoi, hoi, he, he, he, e um deles acompanha esse canto estranho com o seu instrumento, produzindo às vezes tons mais fortes, às vezes mais suaves, de acordo com a sua predileção ou costume. A essas danças, durante as quais muito se bebe, seguem-se provavelmente as cansativas disputas que consistem em carregar um tronco de árvore até a exaustão (...)". (op.cit. 382)
O tema do canibalismo, tratado por diversas vezes, serve para aumentar a expressividade da obra de Denis. Assim, para dar maior vivacidade à sua descrição dos Botocudos, cita, com base na obra do Príncipe de Wied-Neuwied, o relato de um próprio índio, na qual a música também desempenha um papel expressivo: "O Patacho foi trazido com as mãos presas e Jonü Kudgi atirou nele uma flecha, com a qual o matou. Acendeu-se o fogo, cortaram-se as coxas e todas as partes carnosas do corpo, fritando-as. Todos os Botocudos comeram e começaram a dançar e cantar. A cabeça foi pendurada num cordel que a atravessava pelos ouvidos e pelo nariz, de modo que podia ser levantada ou abaixada. Por fim, os jovens usaram-na como alvo de suas flechas. Secaram-na, depois de lhe tirarem os olhos e os cabelos (...)." (op.cit. 218) Quanto à música dos Botocudos, Denis cita Debret, salientando a importância das onomatopéias nas línguas e no canto. As palavras apresentariam inúmeras formas desenvolvidas a partir do próprio som, podendo assim expressar por diminutivos e aumentativos o grau da intensidade de uma ação. Assim, o que se diria "ong" no falar, seria, no canto, "ong ong". Isso demonstraria que o canto seria uma "progressão" da fala. Esse fato levaria a crer que os Botocudos possuiam idéias poéticas bastante desenvolvidas. Os seus cantos, porém, - citados por August de Saint-Hilaire -, seriam altamente monótonos. Faziam lembrar o que haviam dito os antigos viajantes com relação aos bardos dos Tamoios, cujo gênio teria exercido tanta influência sobre os guerreiros que podiam perambular sem receio entre outras tribos.
O primeiro canto botocudo citado por Denis representa uma ordem de caçador a uma velha para que lhe prepare comida ("O sol se levanta. Você, velho, coloque algo na sua panela, para que eu possa comer e partir para a caça") e o segundo canto botocudo uma exortação à caça ("Botocudos, atiremos nos pássaros, porcos, tapires, veados, patos, (...) macacos, cobras, peixes, trairas, piaus"). O terceiro canto citado, porém, embora também representando uma ordem, já oferece um elemento dramático, pois o índio coloca-se na posição do branco: "Os brancos estão com raiva, a cólera é grande: 'Mulher, pegue a sua flecha, nós vamos matar Botocudos". (op.cit. 222)
Esses cantos não dariam uma alta noção da inspiração poética dos Botocudos. A sua música seria tão simples que quase poder-se-ia afirmar ser o seu canto nada mais do que um grito inarticulado que oscilava entre três ou quatro sons. Para Denis, os Maxacalís eram muito diferentes sob esse aspecto. Como ele tinha presenciado, entoavam cantos graves e comedidos com uma certa harmonia, repetindo-os em coro. Os Botocudos, ao contrário, só apreciavam o canto solístico. Mesmo assim, quando um guerreiro entoava um canto a respeito de seus sofrimentos e de suas recordações, os seus companheiros se reuniam ao seu redor e davam-lhe tanta atenção que ele logo se entusiasmava.
Denis considera a musicalidade das línguas indígenas e as diferenças de pronúncia entre homens e mulheres. Como o exemplo dos Guaicurus demonstraria, a ausência de canto não significaria falta de sensibilidade pela música. Embora não cantassem, emocionavam-se profundamente com as melodias tristes das modinhas brasileiras. Muitas vezes vertiam lágrimas ao ouví-las. Essa sensibilidade estaria muito próxima do sentimento religioso, pois já Lery descrevera o quanto os indígenas da Guanabara se emocionaram ao ouví-lo cantar um salmo.
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